Saindo das sombras

Do meu porto olho as marés,

Alta e baixa, como a vida.

O tempo escorre e grita saudades.

Um relâmpago ilumina o rio que me banha.

A claridade estranha se entranha

Enquanto a manhã desanda a jorrar

Sol e rumores

Fios de letras se juntam

Para dizer lentamente

O que me faz viver.

O vento penetra nas árvores

Para fruir lembranças

Verdes e maduras, doces e amargas,

Que decerto nos compõem.

Enquanto põe melodia na água

Que corre às nossas margens.

Agosto morre.

Nasce setembro

O mês da pátria

A bandeira nos socorre

E um canário da terra

Trina o hino nacional

A vida sentada no chão

Vira festival.

A ave colorida pousa nos teus olhos

E respiro tudo em volta

Dois braços cálidos

Misturam-se a mim, como vento e folhas

Fica-me o sabor de alcova

O amor, como um pó temporal, se me vai agarrando

Sempre e adiante.

A certeza se afirma

E tudo abre a brecha

Pro meu atônito voo.

Saindo das sombras

Canto o instante amoroso

Até que deixe de ser instante para ter a fusão com o tempo

Aceso da vastidão

Um relâmpago profundo

Desce ao fundo

Do meu corpo

Eu, absorto, do escuro à claridade.

Do túmulo da minha boca

Explodem ressurreições e trovas

Que já bem sei

Minhas gavetas trancam alegrias

Querendo sair e desatar perfumes

Os lumes cheiram a aurora

E acordo

A luz pousa sobre mim

Como se a vida fosse eterna

E tu.