Capitu
Oh, ardente Capitu!
Surgiste na arte machadiana,
Quiseram lhe fazer um rendez-vous,
Talvez alguma inspiração balzaqueana.
É donzela de sedução ácida,
Impetuosa na sua exposição,
Mulher de carnes fartas,
Deixando homens sob o chão.
Só a imaginação tentou lhe dar forma,
Sua beleza escapa por ser ideal,
Os motivos vulgares sua estirpe ignora,
Dama de ar aristocrático, sem igual.
Os camurros que sofram em suas mãos,
Ou que delirem de prazer,
É de um erotismo estilo furacão,
Sua passagem não deixa esquecer.
Ainda se discute sobre a traição,
Traidores os que ignoram a desenvoltura,
O primor não está na suspensa conclusão,
Mas no desenrolar que a atenção do leitor usurpa.
Capitu, tu capitaste os expectadores,
Personagem que desabrochou do Machado,
Fez suspirar os mais recônditos amores,
Encantando mesmo com um final tácito.
Os pretendentes foram muito mais,
Que o romance revelou nas páginas,
Muitos leitores se fizeram rivais,
Desejando até as desventuras trágicas.
Fizeram de ti arte,
Desconheceram-na como conceito,
Você não possui idade,
Transforma-se com seus maleáveis trejeitos.
Alguns diriam que era liberta,
Mesmo encarcerada nessas roupagens,
Precisamos nos despir dessa imagem indigesta,
Explorar lacunas de uma Capitu em vadiagem.
Porque desejamos tanto dizer o que é,
Se ela se faz justamente pelo não ser,
Embutimos com ardor uma severa fé,
Enquanto a feiticeira escapa ao nos entreter.
Fizeram de sua atuação uma maçonaria,
Escolhidos dizem saber do que se trata,
Mas o símbolo tão facilmente não se entregaria,
Nos faz de fantoches com cordas de malha.
Sua lingerie é com espartilho,
Espreme nossa imaginação,
Sempre ela puxa o gatilho,
Recebemos o projétil no coração.
Suas pernas volumosas,
Sufocam-nos num abraço de baixo,
Ancas de curvas vistosas,
Percurso que para Teseu é ingrato.
Uma nova Vênus caricatural,
Brotando de um romancista,
Fêmea de cadência homosexual,
Anima que eclode do artista.
O próprio nome é espécie de epíteto,
Com um "tu" no final que se refere ao "vós",
Saindo de si em desavergonhado ímpeto,
Deixando um hiato que engole a todos nós.