SEPTUAGÉSIMO PRIMEIRO ANIVERSÁRIO
Alguidar na cabeça, tendo a sogra
para aceitar melhor o peso,
inda a manhã não tinha nascido,
já tu caminhavas, inverno adentro,
levando a roupa da família, para lavar,
nas águas límpidas, que jorravam
para os tanques, agora extintos.
Mas teu sangue ainda quente, tua
juventude cobiçada, todo e qualquer
frio, punha para trás das costas e tu
cantavas, no amanhecer de teus dias,
que, diga-se, não eram fáceis. E,
enquanto as mãos entravam, nas águas
gélidas, brincavas e rias, com tuas
companheiras, que te faziam essa
jovem feliz, apesar do imenso trabalho.
Roupa lavada e torcida, já o sol se via
ao longe, ainda que ténue e de novo
alguidar e sogra na cabeça, era hora de
regressar a casa e a brincadeira não
parava, no caminho íngreme, suportada
a ultrapassar, findo o primeiro labor,
ainda nem o dia havia nascido.
E minha mãe, chegada a casa, mãos
friorentas, estendia as roupas e das
irmãs, já se punha a cuidar,
acendendo a lareira, para o banho da
manhã, até deixar tudo pronto e rumar
à fábrica, onde deixava seu suor e
entrega permanente, como pessoa de
bem, que seu pai, sempre lhe ensinara.
Bem cedo, má doença nos pulmões,
derivada da ingestão, dos pós de vidro,
impediu-a de trabalhar, mas ainda recordo,
como me escondia nos arbustos, na sua
saída da fábrica, para a assustar e receber
o seu beijo e carinho, tão desejado, depois
de mais um dia sem a sua presença.
Hoje é dia do teu septuagésimo primeiro
aniversário. Continuas a mesma guerreira
e nada te impede de trabalhar e de ter
tua casa sempre asseada e pronta a receber,
quem nos queira visitar. Para sempre te
hei-de amar, minha mãe querida, que cuidou
de mim, me ensinou e me amou sem restrições.
Sê feliz, mãe adorada, que eu serei por ti!
Jorge Humberto
08/09/08