Desalmada

No ar um cheiro de tinta

Como se fossem recém pintadas,

As paredes do quarto,

Me vestindo só de lençóis.

Na veste um rastro de sangue

Como se tivesse sido violentada,

Mas o semblante sereno flagra

Um misto prazer, um gozo gritante.

Brigo com meus olhos traiçoeiros

Que teimam em dormir sem te ver partir.

Arranco-os fora pra que os leve embora,

Não preciso de olhos pra sorrir.

Pra mim basta teu cheiro,

Tua fome de mim e uma certeza,

Que mesmo longe, distante esteja,

Faz tão próximos nossos instantes

Que sigo assim desalmada...

Por todos, muitos, desejada

E só por ti possuida.

Sigo com um gosto na vida:

Se morro um dia ou breve, morta esteja

Serei feliz na partida

Pois tive por ti segundos de insanidade

Que me levaram ao êxtase e a eternidade...