Quando te vi, nem te vi
“Quando te vi, amei-te já muito antes.
Tornei a achar-te quando te encontrei.”
,............................................F. Pessoa.
Quando te vi, nem te vi
Porque ando no mundo como cego,
Me nego a ver outros olhos,
A sentir outras almas
Em suas profundidades…
Então nem te vi,
Mas você estava lá,
Respirava e pensava,
E se exalava de onde estava
E vinha até mim
Como da flor vai o aroma ao beija-flor,
Ou a abelha,
Ou como o calor do sol vem até nós,
Mesmo que o cubram…
Então é assim,
É assim que vida pulsa em mim,
Numa luta,
Numa guerra sem fim
Em que lugar para mim é fingir,
É fingir que não vejo,
Nem que sinto,
Não o que sinto e o que me faz andar assim,
Mas as pessoas, as pessoas que têm abismos e tenebrosos modos…
Então, acontece que raramente
Minha vontade é vencida,
Pois a humana condição me governa,
E eu abro os olhos, os olhos,
Para ver quem tão francamente encanta
Não apenas os meus sentidos principais,
Mas uma parte de minha alma vasta e solitária…
E eu te vi,
E quis te olhar, e ficar olhando para ti…
Pois amei em ti, bem antes de ti
O que em ti levas,
E apenas em ti,
E em mais ninguém…
Estou aqui, pensando quando não te vejo,
Pensando em ti para te ver,
E senti o que sinto quando te posso ver…
Ver também é tocar,
É viver,
É ressuscitar…
Assim, sem caução, nem contratos,
Sem fiador, nem testemunhas,
Eis esse liame entre mim e o que vejo em ti
Se fez, e dele vai nascer
No mínimo as projeções ideais do que talvez nunca seja,
Mas não tem nada não,
De ser motriz já valeu a pena,
Pois ao achar-te,
Ao contrário de Pessoa, encontrei-me …
11/11/2018