[21/02]

Não é que eu não tenha feito

um esforço desmedido

pra não escrever o poema do último suspiro

Mas agora teço um verso que é um terço dividido

entre o que antes tava posto,

o que eu achei que tava morto

e a tua voz no meu ouvido

Entre essas próximas dez linhas,

a música alta da vizinha

e você flutuando seus dez passos

entre o cigarro da varanda

e a cerveja da cozinha

Que eu dilascere mais dois pares de óculos

perca 5 ou 6 relógios

pra entender a estrada curva que começa na tua nuca,

se arrasta mais de um metro e meio

e desaba no verde-âmbar dos teus olhos

Que eu reinvente a poesia,

crie uma máquina do tempo e redescubra Alexandria

tenha mais três epifanias

e o azul do céu perca o valor do seu esboço

ou que os esforços sejam tantos (mesmo ainda sendo pouco)

Não é que eu não tenha feito

um esforço desmedido

pra não me perder no teu sorriso

Nem que os versos tenham caído em qualidade

ou que tudo escrito antes tenha umas mil meias verdades

naquele tempo falecido

composto por metade amor, metade vaidade

O poeta virado do avesso

também é uma espécie de recomeço

É sua sina o engessar das rimas

que escreve no declínio dos dias:

Viver dos aplausos da coisa cíclica

de beber - com orgulho - da mesma fonte

a fim de escrever eternamente

a mesma poesia

Elizabeth Gomes
Enviado por Elizabeth Gomes em 10/02/2023
Código do texto: T7716190
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