Ruas
Na rua me perco.
É na rua que estercos ajuntam-se a meus pés, já calejados e cansados
e novidades afrontam meu pensar.
Saudades afins em bordas de copos, em mesas de botequins
dilaceram meu coração que não soube amar.
Não soube amar uma mulher que me fez sonhar
e querer transpor o impossível.
Caminhar é preciso e...
seguindo em frente tentando enxergar o invisível,
meus passos me guiam,
lembranças de abraços, indelevelmente, me guiam.
Saudades de praças mesas e vinhos em taças me arrasam
pois o ecoar das batidas de meu apaixonado coração
ao rever obeliscos e o tilintar das moedas que escapam e vazam pelas minhas alvas mãos faz-me lembrar de momentos e monumentos.
É na rua que tudo acontece: O farfalhar do vento;
beatas em portas de igrejas com longas e tediosas preces;
diademas e edemas nas cabeças sempre preocupadas com a hora.
Nas ruas, meninos cheirando cola, pedindo esmolas.
Nas ruas, toda nudez aflora:
Escassez de dinheiro, atenção e até de domésticos cães perdigueiros.
Um homem preso nas grades de sua própria casa e do tempo.
Preso nos braços de uma mulher amada que ao bater asas
feriu o cerne do peito e embriagou de tristeza um homem apaixonado.
E hoje, só a rua reaviva, celebra tempos idos
ao perambular, ainda trôpego de sentimentos tensos
e embriagado de raiva.
A rua liberta o homem de sua prisão
que ultrapassa as demarcações de sua casa.
A rua dispensa o status e , anônimo, vou caminhando , seguindo, preenchendo o espaço vago, que outrora esteve pleno de você.
Hoje, vácuo.
A rua me atropela. Ator que interpela a dor que exaspera.
Sigo respirando o oxigênio que me mantém vivo em meio às intempéries.
Rua que nua se apresenta, vibrante, ante meus olhos verdes.
Ruas , estradas que pisei.
Alimentaram-me anseios em ter-te, eternamente.
Ruas e abrigos. Amigos que fiz. Uns bons, outros tais.
Nos umbrais de sacadas, beijei-te.
Ruas: Eu, Você e amigas suas.
Hoje, só, a caminhar, saudades de praças mesas e vinhos em taças me arrasam. Fecha-se o cerco.
Tudo me lembra você, em tudo a enxergo.
Na rua me perco.