O dia ja amanhece...

Minhas últimas palavras a ti não sei como serão,

Mas não vão ser palavras de pedir perdão...

Porque não há o que perdoar,

Cada um leva a sua dor, os seus segredos, seus medos de amar.

E eu que não vivi nada disso contigo, não me sinto teu amigo...

Por que o que os amigos fazem, nada disso fizemos, é só lembrar...

Mas poderia ter sido, disso eu não me livrei.

A imaginar um mundo esquecido

No qual um anjo me fez dormi

Um sono bom no qual sonhei

Que o mundo era de poucas pessoas,

Mas com muitos sobreviventes,

Seres intransparentes, carregados de chumbos,

Que não podiam mais amar

Porque o medo tinha tomado conta de seus corações...

No sonho eu vi seres tão jovens apavorados,

Como velhos de almas envelhecidas,

Seres jovens de expressão vencida

Que tinham os olhos machucados de chorar...

Eu vi no sono bom, no sonho que um anjo pintou,

Eu e você a andar entristecidos

Por entre aqueles seres derretidos

Que não podiam mais amar,

Que não sabiam mais o que os poderia salvar.

E nós juntos, felizes por termos juntados nossas mãos,

Mas tristes também,

Víamos que o mundo estava quase destruído,

Destituído de amor...

Cada pessoa, um ser em desequilíbrio,

Andava pendido para um lado,

Com a máscara definitiva da desesperança,

Por que eles não encontraram,

Nem mais podiam encontrar,

Um outro ser que nesse mundo também está,

Esteve, ou estará a procurá-los

Para poderem fazer a comunhão,

E renascerem novos, na horizontal, andando normal,

Mais leves, com se fossem crianças a brincarem de par em par...

Nesse meu sonho, o anjo me apontou a me mostrar,

Num momento em que tu olhavas a tua própria dor,

Que tu também temia, e que talvez, apesar de tua juventude,

Fosse mais velha que eu, e que o medo estava em ti,

E ele devorava, naquele momento, o teu coração...

Eu te observei, e depois me virei para o anjo,

Enganei-me?

E ele disse,

“Não, você está livre, vive a tua vida sem compromisso, e esqueça do resto do mundo.

Queres um dia feliz, um dia raro, às vezes impossível...”

Sabe, ele me disse com sua voz surda,

“Você não teme amar,

“E pode te envolver muitas correntes,

“Você sempre as poderá quebrar,

“Porque o teu coração é a tua decisão

“E a tua cabeça está num plano lá embaixo,

"As dores que sentiste,

“Os amores que sofreste

“Ensinou-te, e você realmente aprendeu...

“Mas a observe, a observe tremer,

“Apesar de ter encontrado você,

“Apesar de saber que esse foi um raríssimo encontro,

“Olha ela a observar as sombras,

"A lembrar do passado,

“Sinta a dor a invadir seu coração,

“E o medo a lhe roubar as forças...”

Pare! Eu disse, pare!

Deixa-me acordá-la!

Por que não posso alcançá-la?!

Deixa-me espantar aquelas sobras que se apoderam dela e a cercam, e dizem coisas a ela!

E ele disse,

“Não...

“Você não pode fazer nada,

“Cada um deve descobrir-se a si mesmo,

“Cada um deve conviver com sua dor,

“Cada um deve escolher entre o medo

“E, por vocês, o tão sonhado amor...”

Mas, eu disse, por que ela se distancia?

Por que ela não olha para mim?

Por que ela me abandona agora

No momento de nascer o sol, por quê?

Por que se agora as flores do campo vão desabrochar

E vão nos presentear com seus odores,

Oh! Esse não é fim de minhas dores!?

E ele disse,

“Calma, tudo a seu tempo,

“O coração que ela carrega é tão jovem,

“E ela acha já ter sofrido tanto,

“Ainda não sabe avaliar o que acontece...

“Lembras-te quando ela disse

“Que você agia como se apenas

“Vocês dois existissem...?

“Pois é, ela ainda teme, ainda olha dentro de si as recentes cicatrizes,

“Não sabe mesmo o que é uma verdadeira dor, e pode ser que nunca saiba...

“Não consegue viver sem que antes

“Análise o impossível, o Futuro.

“Essa alma teme, e em momentos escuros,

“Ela chora amargamente...

“Você sabe disso...

“Lembre-se de você, do medo que tinha...

“Está certo que despertaste muito cedo,

“Mas creia, a seres que vivem cem mil anos,

“E não conseguem se libertar...

“A primeira dor no coração pode ser uma eterna prisão,

“E a pessoa pode não querer nunca mais sonhar...

“Outros vão amando, e vão se libertando,

“E vão sofrendo, e vão aprendendo

“Até que fica claro em suas essências que

“Que só o amor pode salvar,

“Só o amor pode salvar...

“E ela agora rodeada, olha só,

“Não pode mais nos ouvir,

“Em seus ouvidos, lembranças fazem seu coração doer,

“E ela teme viver novamente essas dores

“Numa relação real.

“Mas pobre criatura,

“Ainda não percebeu que as sofre de qualquer maneira,

“Toda vez que lembra, toda vez que compara

“A vida passada com a possível vida presente,

“A dor que por ventura adormecida, recrudesce, como acontece agora.

“E ela se distancia da vida que poderia salvá-la...

“Deixe-a ir...

“Pode ser que um dia ela veja que não existem impossibilidades.

“Que a amizade, toda amizade é um amor frustrado,

“Que a amizade não é necessária onde há espaço para o amor...”

Eu disse, vamos parar,

Já vi que ainda terei que conviver com a solidão,

E que as esperanças que tive

Foram folhas amarelas

E que caíram facilmente,

Mostra isso para ela, faça isso por mim...

E agora me vou embora,

E aproveitar esse resto de noite para caminhar,

Pode ser que eu encontre

Uma forma de conviver com mais isso,

Porque a frustração invadiu o meu peito,

E eu preciso de um tempo sozinho.

Me decepcionei-me a mim mesmo,

E eu queria, mas só neste momento,

Não ser assim... Deixa-me ir também...

Entrega a ela essas palavras,

Que seja em sonhos, sei lá,

Mas a faça saber de tudo que falamos.

E que, apesar de tudo não estou destruído,

Que não existe amor proibido,

Nem experiência sem lição,

Deixa-me ir, o dia já amanhece,

E quero dissolver nele minha desilusão...

03.05.07

Sebastião Alves da Silva
Enviado por Sebastião Alves da Silva em 14/02/2013
Reeditado em 14/02/2013
Código do texto: T4139370
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.