Amor Epiléptico

Venha pros meus braços,

Com esse corpo amolecido,

Caia num arrepiante desmaio,

Com seu jeito desfalecido.

Seus cabelos ao chão,

A queda e o impacto,

Daquela cena de convulsão,

Parecendo algo estático.

Seus membros retorcidos,

Uma simulada atrofia,

Aquele ser reprimido,

Pra muitos uma anomalia.

Te acham possuída pelo diabo,

Olho além dessa tola crendice,

Te vejo e não me embaraço,

É um deleite ver sua tumultuada crise.

Os dentes cerrados,

A baba que escorre,

Os olhos esbranquiçados,

A língua que quase engole.

Deixa eu beijar essa boca rígida,

Tocar esse corpo voluptuosamente inerte,

Mesmo que assim se torne frígida,

Ainda é um momento que a tenho como entregue.

Se com o demônio está,

Quero junto me sujeitar,

Iremos no Inferno gozar,

Nenhum exorcismo atrapalhará.

Que seu cérebro apague,

Desse jeito quero enlouquecer,

Como num choque que desague,

Num momento sem porque.

Ainda que chamem de patologia,

Pra mim é liberdade dessa razão,

Nesses momentos que a sinto minha,

Ou melhor, sem ter qualquer possessão.

Fazer amor sentindo teus espamos,

Beijando essa boca de ósculo retido,

Aprofundando nesses olhos esbranquiçados,

Amor de morto-vivo, nos façamos vampiros.

O público que fique com seu preconceito,

Amedrontados por sua visão apaixonante,

Que eles sejam levados a seus mais recônditos medos,

O destino guardado aos ignorantes.

Estarei ao seu lado segurando sua cabeça,

Seu corpo trêmulo em meus braços,

Aguardo que os sentidos se restabeleçam,

De volta à realidade eu a enlaço.

Enxugo o canto da boca com guardanapo,

Cubro a calcinha à mostra com o vestido,

Trato como amante dos mais solidários,

Amor que envolve cada gesto vivido.

Seu gosto de ácido valpróico,

Misturado ao sangue do ferimento,

Que se ao cair no resistente solo,

Me dá uma sensação de entorpecimento.

Grandes nomes na História,

Tiveram epilepsia,

Então não se faça inglória,

É minha doce heroína.

Porque não amar a doença?

Exaltamos apenas a vida,

Mas a morte é forte presença,

Por isso aceito ambas as medidas.

Renegar essa sua parte mais liberta,

Seria deixar o melhor de você escapar,

Não que assim eu possa a ter como certa,

Mas posso também contigo transbordar.