Viver e morrer
Por que falar
Se as pedras, únicas amigas,
Não me ouvem
E as árvores caem para o lado
Ao me verem chegar?
Na estrada por onde caminho
Não vejo a quem procuro...
Tanto tempo diluído nessa noite,
Entre essas camadas de silêncios
Devo ter ficado
E o ser que vaga
Exposto a esses olhares
Tão normais,
Eu não conheço...
Sou outro,
Um ser livre,
Sem sonhos,
Sem amigos,
Sem obrigações...
Essa paisagem de chumbo,
De distâncias,
De pensamentos incompletos,
Desconexos,
Perdidos desejos já caducos,
Me parece amigável...
De certa forma
É bom está aqui
Sem vontade
Sem compreensão,
Apenas assim...
Apesar de que
Eu poderia gritar
E desistir disso,
E imaginar que talvez
Fosse bom dizer bem alto
Que um dia meu coração queimou
E me aprazer mais
Por não falar nada
E resistir ainda uma vez
A essa doce tentação...
Olha
Fui ali e soltei
Do precipício meus poemas
Iniciados
Idéias que rascunhei
Quando não tinha tempo
Para concluí-las...
Sempre me vieram
Quando não as quis,
Agora que se foram,
Lembro-me que um dia cri
Que pudesse terminá-las
E formar algumas páginas
Que pudesse ser o passatempo
De alguém...
Mas eu jamais os revi,
Agora
Anacoreta reverso das coisas
Sinto-me livre
Sem nenhuma necessidade,
Sem desejos,
E mesmo sem sonhos,
Levando a vida assim,
Entre um passo e outro,
Um intervalo apertado
Que contem toda minha filosofia...
Ah, sim,
O teu rosto
A maquiagem que esconde
Teu ser inviolável,
Teu rosto
Tantas vezes,
À força de imaginação,
Por meus dedos medrosos
Riscados...
Teu rosto desfeito no tempo,
Um vulto de minha lembrança,
Ainda penso nele de vez em quando...
Mas é rápido
Porque morrer e viver
Para mim é uma só coisa...