Carta de Amor
Escrevo estes versos,
Como prova de afeto,
Desdenho dígitos simétricos,
O amor como a letra é incerto.
Vou deslizando pela lauda,
Preenchendo as linhas,
Quase sem dar uma pausa,
Ofertando a tosca caligrafia.
As palavras mal traçadas,
Acompanham os picos de emoção,
Numa hora são bem trabalhadas,
Noutras uns rabiscos de difícil visão.
Seguem o vazio do papel,
Alinhavando apaixonadamente,
Escritor que não espera troféu,
Se desfaz em frases, intempestivamente.
Beija aquela folha já rota,
Tenta imaginar quando for lida,
Abusa do sentido de forma louca,
Procura o aroma da mulher preferida.
Passa dos limites impostos pela página,
Enche as bordas, escreve até ao contrário,
Faz desenhos numa simbologia apaixonada,
Diz que morre de amor se for necessário.
Deposita gotas de seu sangue como oferenda,
Assinatura com ares de pacto sinistro,
Só um coração amante talvez isso compreenda,
Sem limitações ao que é amor vivido.
Permite rasuras para expressar o desespero,
A estética apolínea é ignorada pela sofreguidão,
Manda às favas tanto o formalismo quanto a erudição derradeiros,
Sabe que amar não segue regras impostas pela razão.