Um Pranto
Começo pedindo desculpas,
Pelo que fugiu a um “bom senso”,
Vivemos situações intrusas,
Nem sabemos como as concebemos.
Estava diante de uma realidade,
Me deparei com seu rosto angelical,
Fui tomado de um sentir pré-tempestade,
Quando o tempo cinzento anuncia temporal.
Vi as lágrimas brotando de seus olhos,
Eram de uma suavidade encantadora,
Deslizavam levemente enxarcando-lhe os poros,
Parecia uma singela cachoeira vindoura.
O momento não era feliz,
Mas seu choro tomou-me,
Quase chorei, por um triz,
Solidário ao que houve.
Sua face de uma brancura de mármore,
Mas com contornos muito delicados,
Eu fiquei plantado ao chão, feito árvore,
Tentava compartilhar contigo o fardo.
Olhava na profundidade de seu olhar,
Querendo mergulhar naquelas lágrimas,
Me senti longe demais para poder lhe tocar
Aquela ferida aberta que causava lástima.
Sua tez assumiu tonalidade rosada,
Parecia um créspuculo em seu rosto ensolarado,
Tive impressão que estava corada,
Apenas contemplei de forma discreta, fiquei calado.
Pessoas indo e vindo ao seu encontro,
Mas sua figura iluminava aquelas sombras,
Eram nuvens passageiras entre nós, lhe garanto,
Só desejando que as brumas não mais fizessem afronta.
Quebrava por dentro ao te ver sofrer,
Mas seu choro era quase divino,
Respeitava sua angústia, por isso consegui me deter,
Mas queria lhe fazer carinho.
Nossos trajes negros tinham harmonia,
Uma dor também foi compartilhada,
Me senti próximo, mesmo longe, eu conseguia,
Mas minha essência também dilacerava.
Seus cabelos negros pairavam sobre os ombros,
Acredito que o aroma era dos mais doces em afeto,
Os contornos de sua face denunciavam assombro,
Diante da tragédia os traços evidenciam até o discreto.
Não poderia ignorar tamanha desgraça,
Mas me apaixonei por seu pranto,
Peço que não me odeie por essa paixão ingrata,
Não foi proposital, fui tomado de espanto.
Eu amei cada lágrima sua,
Porque fui tocado por dentro,
Me abri com sincera ternura,
Lhe ofertei amor como provimento.
Tentando enviar meus pensamentos,
Querendo tocá-la em conforto interno,
Para abrandar seu doloroso sofrimento,
Mas me senti inútil, impotente, patético.
Seu choro foi um dos momentos mais lindos,
Mas trocaria esse momento por sua felicidade,
Antes te ver de dentes expostos, sorrindo,
Do que tomada por essa incurável saudade.
Emocionei por ter o coração inundado,
Ignorei que fosse sangue, imaginei apenas “o sentir”,
Transbordei pra dentro com um suspiro insuspirado,
Para todos eu neguei o fato, consegui com ardil omitir.
Seu choro foi tão profundo,
Não sei se um dia conseguirei esquecer,
Talvez quando eu deixar o mundo,
Talvez suas lágrimas eu hei de merecer.
Seu sorriso havia se apagado,
As lágrimas tomaram o lugar,
Seus lábios mais selados,
Sua respiração em meio ao soluçar.
Qualquer divindade se renderia a seu apelo,
Quem não cederia a seu pranto,
Eu, um simples mortal, quase enlouqueço,
Os medievalistas diriam: - Choro de Anjo!
Cada pelo de seu rosto se rendeu às gotas,
Os fios desciam de forma harmoniosa,
Morriam no colo ou antes na extremidade da boca,
Expressão tristonha de uma visão lacrimosa.
Sua voz mantinha o timbre afetuoso,
Continha a tristeza e impunha sua majestade,
Nenhum gesto seu é presunçoso,
Encanta a qualquer um, não importa a idade.
Sua presença faz os astros se deterem,
Param e observam com acuidade o planeta,
Pois uma estrela humana os fez surpreenderem-se,
Com luminosidade além dos raios ultravioletas.
Agora compreendo as tragédias gregas,
O poder do lamento de uma dádiva,
A desilusão de que muito herói padecera,
A esperança de vida em situação trágica.
Seu pranto pra mim é prece,
Através dele acesso meu âmago,
Uma mulher assim não se esquece,
Por eternidades em que não se contam anos.
Mais uma vez me desculpo por respeito a sua dor,
Peço apenas compreensão para um apaixonado pela vida,
Que no seu choro descobriu uma nova forma de amor,
Sabendo orar dentro de si por cada orvalhada lágrima de sua órbita expelida.