DEAMBULAÇÕES OU TALVEZ SENTIMENTO

DEAMBULAÇÕES OU TALVEZ SENTIMENTO

A branca côr de um papel me olha,

Inerte, transparente, curiosa!

Dedilho na mente palavras e sonhos

Que a mão trémula tenta desenhar

Naquele pedaço alvo de alva folha!

Sozinho, apenas eu e minha alma fogosa

Pensam os gestos que caracteres risonhos

Saltitantes como crianças no seu brincar!

Sentado na velha mansarda que é meu lar,

Olho longes céus e perscruto o horizonte

Na vontade incessante de cruzar o mar!

Ah! O mar, sempre esse companheiro,

Meu lavrador de raivas e pensamentos

Chovedores de brancas pétalas de luar

Entrando de mansinho, levemente primeiro,

Mas depois velozes no coração como o vento

Que bate nas rochas feitas gigantes a vigiar!

Naquele recanto tão singular e só meu,

Sorvo do ar a inspiração sobre aquele papel,

Tão simples, tão doce que até o mel

Das palavras lhe servem de véu!

A velha mansarda que escuta os apressados

Passos de operários de peito ao léu,

Suando cicratrizes de fé nos calos não sarados,

Tenazes, orados, de força feitos, de amor construídos,

Clamando por deuses ou talvez pelas flores

Que o sorriso lhe dá nos sentimentos sentidos

De um alguém que espera por seus calores!

A branca folha, de alva neve, fica aos poucos colorida

De versos e canções que choram e cantam a vida!

Um passarinho distante me faz companhia no seu voar,

Cruzando o firmamento cheio de azul e salpicos

De núvens apressadas a caminho do mais distante!

Canta-me uma sonata de Bach, ou talvez um fado

Tal como o dos marinheiros destemidos,

Olha-me no meu balbuciar apaixonado e amante

Buscando na melodia a mística dos sentidos

De praias bordejantes que são meu cuidado,

Protectoras de qualquer perigo distante!

A velha mansarda me acolhe com carinho!

É meu palácio onde escrevo sozinho

Os poemas de vida, de raiva, esperança e amor

Que dedico como aliança perene, inseparável,

Porque sentado naquele banco carcomido de tempo

Sou o mais rico dos humanos, inigualável,

Porque agarro as brisas nas linhas que invento

Em palavras vivas, de desejos de caminhar!

Jose Domingos
Enviado por Jose Domingos em 10/04/2010
Reeditado em 10/04/2010
Código do texto: T2189291
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