Pedras opacas ao banho de lua

No morro dos cachorros que uivam

morro de amores, solitária loba

um rio passa a limpo as nossas vidas,

jogo na mesa todas umas poucas fichas

Corro desimpedida pela mata

matam-se as crenças em mim

que me fino também, assim

No mato sem cachorro ou lobo

será que me morro enfim?

Não quero mais essa brincadeira

Vou trocar de atiradeira, pegar

um pião na unha, fazer a piorra rodar

Porra! Não era assim que o amor

devia vir: devagar e certo, belo?

Tinha que ser tão avassalador?

Deixar-me prostrada em joelhos

a mendigar teus favores. Então

já não me queres como te amo.

Se me infliges uma dor sem lança

eu na mão, em contradança,

as crenças tantas contrariando .

Fazia eu melhor só comigo,

mas há a saudade de ti.

Eu mesma sei mais não de mim,

como chegaste a assim.

É fortuito o teu agrado,

foi ciranda o nosso passado:

vidro quebrado, rua sem ladrilhos,

apenas e tão só pedras opacas.

Eu, ainda enlevada, encantada.

A vida tornou-me tensa, que só

o lacerante uivar destoa

tudo à volta está um nada

em mim há mortes tantas

das pessoas que fui e sou, oh!

Tanto sofrer só pode adivinhar

alvíssaras, ou a final ceifa fatal .

Dou um giro e já sou uma nova

quem não te quer a meu lado,

estás acuado por mim, comprova

não mais te amo, vestida carmim

estou na rua, nua a fera solitária

uivando veraz em banho de lua...

Juli Bauer
Enviado por Juli Bauer em 23/03/2009
Código do texto: T1501298