Indizivelmente Poético

'Dá-me as borbulhas do champanhe que tens nos lábios.

Roça-me em beijo com a madura tez de pêssego.

Brinda-me claridade em ser de tua taça...'

O terceto acima pretendia ser o ínício de um sincero poema festivo,ainda que dolente,para um novo ano.

Ocorre-me,porém,aquele lapso:é uma parede interposta entre o desejo de dizer,o sentimento incontido e as palavras, o que visualmente resulta em quase nada.

Porque a rima empobrece, o ritmo vagueia e o miserável verso vagabundeia anêmico.

Lembro-me,então,que a poesia é maior do que o poema,pois anda vestida do sentir.

A poesia mora na rua.

Visita a tua casa,vive nas tuas gavetas.

A poesia a tudo espreita: senta-se contigo à mesa do café e com o parlamentar,emposta-se em palanque.

A poesia passeia nas favelas e mansões.

Vela o sono do menino acuado;deita-se na cama 'king size'.

Come de todas as mesas,bebe de todos os cálices,dorme e desperta sob todos os céus .E é faminta ,e é sedenta, e é insone.

Vigia e controla.

O poema é figura difícil ,pouco dada à convivência.

Te visita, somente quando ele deseja.

Não participa de todos os círculos.

É menos popular,mais reservado.

A poesia está no peito; o poema,às vezes,está nas mãos.

Não se pode dominá-lo.

Mas,é ele que controla.

Assim tem sido o passo do meu tempo:

sentidamente intenso, incontrolavelmente vivido.

Um poema tão indizível,quanto irrecuperável.

Feliz verso novo!

Felizes tempos!

Zully Oney Teijeiro Pontet
Enviado por Zully Oney Teijeiro Pontet em 27/12/2005
Reeditado em 27/12/2005
Código do texto: T90864