PARABÉNS PRA NINGUÉM - um poema descomemorativo do golpe militar de 1º de abril de 1964 -

Há quarenta e nove anos,

chovia.

Então, junto com as águas turvas

que desciam dos céus,

misturadas às fezes

que transbordavam dos esgotos,

surgiu uma gigantesca

e asquerosa serpente

que escondeu a luz,

devorou os jovens,

violentou a inteligência,

a liberdade,

reinando, por loucos anos,

sobre Brasil,

que, vazio de sentimentos,

a tudo assistia,

estarrecido e anestesiado,

em meio a uma partida de futebol.

A serpente,

que devorava livros,

vestia-se em tons opacos

de verde, branco e cinza;

e até as músicas

entoadas pelo povo

eram engolidas,

silenciadas,

seviciadas,

em sua incessante

voracidade

e intolerância.

Um dia o povo unido

matou a serpente,

porém, em nichos secretos,

ovos bonitos e transparentes,

ainda gestam inúmeros

outros filhotes,

sob o cândido disfarce

de ovos de águia.

- por José Luiz de Sousa Santos, o JL Semeador, na madrugada de 1º de abril de 2013, pensando no golpe militar e no filme “O Ovo da Serpente”, de Ingmar Bergman –