O FERREIRO
(acompanhado de kipexi, coro e dança)
Por entre os primeiros alvores da manhã, eis senão
Quando o vento uivava e bramava num estranho misto
De euforia, preces e lamúria
Anunciando o sacrifício do ferro em brasa!
Desta feita
O Mestre ferreiro recebera a incumbência divina
Com o fim de forjar a Memória do povo na bigorna
Implorando ao Uyangongo que foi ter para as serras
E ao totem que oculta-se em esconso do mato—
Naquele breve momento, o Sol, no que lhe toca
Já então se encontrava emplumado nos seus encalços
Longe das terras descampadas
E as águas que patinhava quase lhe davam pelos beiços!
Nosso ferreiro está entregue ao espírito do fogo
No braseiro que toma a cor de sangue transpirado
Pelos poros da pele
Enquanto do alto, a Garça diz-lhe charadas—
De noite, o amuleto se lhe apresentará em sonho
Ante a nuvem tão trevosa quão imperiosa—
Mais hoje, mais amanhã, por uma vez mais
Ele voltará ao canto do terceiro macho galináceo
Num alento renovado e acentuado, concomitantemente
Com aquele bramido do vento que provém do fole
Anunciando o sacrifício do ferro em brasa
E a chuva grande que está por cá a chegar!
Uyangongo — ente mitológico.
Escrito em Kimbundu.
Tradução portuguesa do Autor.