Águas correntes
Para Cacilda em homenagem a Correntina-Bahia
Águas correntes
Já dormem e deliram pardais
E bem-te-vis. Sob as pontes
Corre uma Veneza do sertão;
Verde escuro, azul, lilás
Atravessando almas e raízes.
Por janelas e frestas entra
O verão; vida nativa e plantada
Se estendem por trilhas, a
Cidade aos poucos acorda ainda
Sonolenta com dores de cabeça
Do vinho e de moças inocentes.
Meninas moças com andar de
Aves debutam nos remansos
Onde a vida corre tão calma
Quanto o giro eterno da roda
D’água, ali nascem seus peitos
E pelos, deseja agora amores
Ardentes, nuas cá esperam morder
Os lábios ruborizando os rostos.
Os bambuzais em pontos
Eqüidistantes, flores, lavadeiras,
Árvores ribeirinhas aplaudem
Eternamente os sons das quedas
D’água; os meninos, sorveteiros
E dedos-verdes refrescam-se no
Rio, almas tão cristalinas quantos
As águas, donos de tudo donos de
Nada; no rancho ouve-se sons das
Estrelas tocadeiras de violino.
As vozes que vem do campanário
Repete o início do século que
Dorme, por ali se amontoam
Velhinhas cansadas de tanta
Vida e de amores, nas praças
Nas noites de novenas acendem
Velas esperando por ela.
No cais, areais e gramados
Se esticam ao sol de janeiro
Arcanjas-querubinas douradas nos
Seus fios e cavas enlouquecendo
Os carentes e matando de paixão
Os indecentes; por entre os lábios
Docemente passam sussurros.
Flores desabrocham em amores,
Uma semente cai e navega
Velozmente, um incêndio solar
Avermelha o céu desmaiado,
Nas copas das árvores se
Transformam em sombras de
Tons indecisos.
O poente é um palco celeste
Onde se apertam nuvens
Expectadoras e coadjuvantes,
O sol lança sob as águas, flechas
Douradas, rajadas de tons violeta,
Laranja, rosa e verde.
A senhora noite já anda pelas
Ruas de pedra e árvores; nos
Ninhos sossegam os passarinhos,
Lentamente invadem as sete ilhas,
Vaus e riachos; estrelas iluminam
Roseiras furtando as almas
Pervertendo-as de desejo e paixão
Lentamente a vida se repete
E a noite se entrega despida.
Autor Irineu Magalhães
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