A CIDADE E O CAMPO
Corro para o terraço,
ver estrelas ansiando.
Tenho saudade
das noites nos vinhais.
Recordando,
silêncios
e longas conversas
ouvindo os pardais.
Na sua humildade
o analfabeto
era filósofo,
e o camponês
contava mais uma vez
a história de Dona Inês.
Mas o que encontro?
No horizonte ofuscada
uma lua solitária;
Nem a mesma parecendo!
Se impondo e se escondendo
da cidade cintilante
que nem vê
se é nova ou quadrante.
Venho para o terraço
na esperança
de ouvir a natureza,
dessas noites beiroas
de grilos à desgarrada,
azeitonas no regaço,
rãs na represa,
água do riacho,
murmúrio da serra,
caniço dançando,
e silêncio...
acompanhando
a música da terra.
Mas o que encontro?
Ambulância correndo,
polícia perseguindo.
Futebol que grita ganho e perca.
Avião que silva,
e a cidade não ouve,
quase surda e cega.
Venho ao terraço
procurando meu próprio som,
para não pensar,
contemplar,
me envolver,
meditar,
me conhecer
e saber quem sou.
O que encontro?
Ruido, poluição,
realidade?
Não me sinto inteira.
Nem integrada.
Mas a estrela só está tapada
pela núvem da cidade!
Estarei poluída e confusa?
Minha razão recusa
à evolução esta finalidade.
Do murmúrio da natureza
ao ronco da cidade,
vivo na fantasia
da realidade?
Mas as luzes da cidade
não ofuscam a beleza
do murmúrio do riacho,
das uvas o doce cacho,
da macieira, da roseira,
do azeite no lagar,
ou de sorrateiras risadas,
ou de puras gargalhadas,
no longo jantar
regado com vinho da adega
e à vida brindar.
Mas... o que digo?
da minha mente nada foi esquecido!
Quando fecho os olhos
tudo posso ouvir e ver:
aqui é noite, acolá o entardecer;
me enriqueci por lá ter ido.