Sangue e poesia
É dito que o dom divino,
Aquele inatingível, inexplicável, incompreensível,
Reserva para cada um o tamanho da sina,
E afere o peso do fardo.
É pesado o fardo e é difícil a sina do poeta.
Fui feito assim, poeta.
Com raízes em terra seca,
E coração de sal, fino e quebradiço.
Tal como pássaro de arribação,
Tinha os olhos voltados para além da serra mais alta.
Chegada à hora, era tempo de voar para longe.
O dom divino então cavou a terra
E arrancou as raízes (sua mãos ficaram sujas).
O vento soprou e empurrou a arribação (são as estações da vida).
Foi então que o peito sangrou
Em um vermelho vivo de saudade.
O mesmo dom divino há de me reservar
A consciência do compasso do tempo.
Sem a angústia pelo tempo a viver,
Nem o saudosismo paralisante de um tempo morto.
Pois a arribação volta sempre ao seu lugar.
Até lá o peito vai sangrando.
Uma hemorragia de verso e dor,
Tingindo de saudade o papel alvo e leviano, que aceita tudo.
Coagulando nele a poesia adormecida no coração
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