Barquinho

Lá vai meu barquinho de papel,

Levado pela correnteza do rio de lágrimas

Que chorei na noite fria em que me descobri existindo.

Todos os dias verto lágrimas amargas, grossas lágrimas,

Muitas lágrimas:

Lágrimas de desenganos,

Lágrimas de amargura,

Lágrimas de dissabores,

Lágrimas de derrortas,

Lágrimas de ser sozinho,

Lágrimas por não haver pontes que me levem a ti,

Lágrimas por ter-me perdido pelos descaminhos da vida.

Lá vai meu barquinho de papel,

Levado pela correnteza que se avoluma,

Pelo rio de lágrimas que se alarga e ameaça

Extravasar-se,

Extrapolar-se,

Perder-se em fúria cega,

Devorando as margens,

Agigantando-se em ondas que se arrebentam contra os rochedos

Em soluços dolentes.

Lá vai meu barquinho de papel. . .

Meu barquinho naufragou

Sem ter cumprido seu intento:

Chegar intacto ao cais.

Também naufraguei, perdi-me, desavim-me

Sem ter cumprido meu intento:

Chegar a um cais que me ofertasse

A possibilidade de pegar uma embarcação

Que me levasse, cruzando os mares,

Ao cais absoluto onde depus meus sonhos. . .

Oliveira