NEM SURDO OU CEGO

NEM SURDO OU CEGO

 

Tudo é relativo ou até abstrato,

Se atendo à vontade sem porquês,

E o que acho belo pode ser barato,

Ou pode ser ao gosto do freguês.

 

Um dia me disseram sobre um carro,

Que eu não teria o tal Rolls-Royce,

Mas o que não sabem é sobre o barro,

Onde só mesmo meu asno é feroz.

 

Isso eu soube na estrada de terra,

Naquele inverno pelo baixo sul,

Escorregando, meu fusca viu serra,

E três dentes na trava é surucucu.

 

Serpenteando, eu fui bem mais longe,

E a beira da praia era em Camamu,

Onde eu vendia a enxada pro monge,

Querendo em setembro comer caruru.

 

Da enseada eu trouxe um bom peixe,

Com camarões frescos e defumados,

E veio o dendê amarrado num feixe,

Que fora colhido na beira do lago.

 

Chegando em casa eu pilei o dendê,

E me lembrei de um café arábica,

Porque o conilon eu tomei sem saber,

Que o melhor vem com a prática.

 

Quando novo eu jogava a sinuca,

E acertava tudo e até entortava,

Mas agora, velho e sem a batuta,

Já não rejo musicais, nem à tapa.

 

Só não quero morrer surdo e cego,

Pois o mundo é lindo e é musical,

Pois eu vi sabiás em aconchego,

Com os curiós em pleno festival.