A FESTA QUE PERDI
A festa que não fui, vive em devaneios e verdades meus
Imaginados a desoras, na noite de breu, fria e longa
Por entre a música rápida que não sei dançar
E a tal comemoração que já não me recordo
(Se aniversário ou se casamento)
De lá, chegam-me conversas e risos em cacofonia
Vejo os passos recurvados
Que se encontram, se evitam e ainda se cruzam
No barulho dos sapatos a bater o chão e a chiar
Ao mesmo tempo que eu, na tamanha solidão
Contemplo o vazio da minha escolha
Imagino o álcool consumido, as calúnias espalhadas
Os abraços dados, acolhidos e negados, a hipocrisia
As roupas novas desfilando pelas paredes
Com tanta vaidade nos gestos consternados
E confesso que, ao menos, cabe-me a entender
Se realmente careço dessa festa não vivenciada
Lá pelos confins do Kazenga*
Porém, no silêncio da minha ausência preferencial
Há presença de rostos simulando alegria nos olhos
Até mesmo rastos do calor suado, o cheiro de tabaco
E dos perfumes que, acaso, não inspirei
Nessa festa que passou por mim tão rapidamente
Já com um ritmo lento a ecoar umbigadas
Enquanto eu, desajeitado em todas as danças
Fiquei apenas a assistir, distante
A festa que perdi, deixa uma memória um tanto peculiar
Quando ao amanhecer, a dança termina, a porta fecha
E cada um segue seu indeterminado percurso
Que se arrasta pelos cascalhos, rumo a destinos vários
Eu, ausente, sigo também o meu, imaginando
As belas damas com as quais nunca cheguei a dançar.
*Kazenga = um dos bairros de Luanda (Angola)
Redigido em Kimbundu.
Tradução portuguesa do autor.