CABELOS E SONHOS

CABELOS E SONHOS

 

Se vão os cabelos e ficam os sonhos,

Dos tempos de jovem, cheios de agonia,

Mas nada impede comermos os sonhos,

Se a diabetes não estiver em dia.

 

Enquanto fui jovem a franja falava,

E eu desperdiçava os dias e noites,

Pois acreditava na força da clava,

Mas não me sabia o vento em açoite.

 

Olhava pras copas de árvores sãs,

E todos os pássaros sobre elas,

Previa a televisão nas manhãs,

Com o sinal agudo de suas telas.

 

Enquanto sonhava com carros e heróis,

Jogava com as gudes e bolas de meia,

Colhia feijão no algodão dos lençóis,

E ressuscitava com mel as abelhas.

 

Houvera esse tempo sem tecnologia,

Mas a manufatura nos dava a visão,

Com a sensação de que tudo servia,

Até alfarrábios pra ter a noção.

 

Sentávamos todos na roda do livro,

Ouvindo os tios contarem estórias,

Pois tínhamos mico, onça e grilo,

Mas o jabuti concorria à vitoria.

 

Pulávamos de armários querendo voar,

Pois o super-homem estava nas telas,

Se um americano é que tinha lugar,

Nessas fantasias de ter cinderelas.

 

Somente agora, velho e despojado,

Sob um telhado fazendo goteiras,

Eu vejo que fui iludido, enganado,

E já não importam essas besteiras.

 

Só quero a paz do bom convívio,

Ao lado de amores que não despeço,

Pois a reciprocidade é preciso,

Pra vida ser boa... é que peço!