Amor sepultado
Descobri nesse tempo
Que nem tudo que jaz
Está morto
Por vezes enterramos
O que é pura vida
Não porque morreu
Mas porque é desejo do outro
E assim se faz
É um enterro em vida
Sem velório
Sem flores ou despedida
Apenas se abandona
Larga sobre a terra
O tempo é que trata
De cobrir o que agoniza
Não por dor da morte
Mas pelas dores de vida
E a cada dia
Uma nova camada
O tempo coloca
Escondendo dos olhos
O que permanece vivo
Aos poucos não vêem mais
A cova se concretiza
Só que o que nela jaz
Morto não está
Vivo permanece
Mas a ninguém compadece
É sepultura largada
Nem um nome traz
O peito em que habita
Sangra eternamente
Carrega tamanha dor
Que coagula
Forma uma camada
Uma casca
Que cobre do mundo
A dor que fica junto
Ao que enterrado foi
E quanto mais passa o tempo
Mais dor e lamento
Na sepultura jaz
Também descobri que não se desterra
O que desejou enterrar
Morto ou vivo
O que na sepultura está
Por toda vida
Lá permanecerá
Não haverá velas
Ninguém a visitará
Será apenas um monte de terra
Abandonada sem cuidado
Sem nem ser lembrado
Um túmulo esquecido
No tempo perdido
Quisá em outro tempo
Todo sentimento
Que nesse frio sepulcro está
Veja sobre ele
Brotar lindas flores
Exalando um doce perfume
Por todo lugar
E assim possa
Através desse aroma
Chegar aquele
Que quem jaz ali ama
O fazendo relembrar
Que aquela a quem enterrou
Somente lhe amou
Sem nada esperar
E mesmo depois de tanto tempo
No frio, no escuro
Na dor, na solidão
No abandono
Nas tantas feridas
No sangrar do coração
Continua o amando
Mas já agoniza
Seu tempo de vida
Esgota e finda
Debaixo dessa terra
No tempo que se esvai
Não morre o sentimento
Morre o corpo
Que depois de tanta dor
Perde as forças
E sua hora finda
Agora, a sepultura
Não traz sentimentos
Traz um corpo vazio
Sem um olhar
Sem temperatura
Um corpo que já está no sepulcro
E lá permanecerá
Ainda abandonado
Sem uma lágrima
Sobre ele
Ninguém derramar