Somos casa
Entre antigos casarios
De tantas décadas atrás
Caminhei observando
E fiquei pensando
Quantas histórias neles jazem
Talvez algumas lindas
Onde o amor se fez constante
Outras de dor tamanha
Por ter sido o amor ausente
Todas, com certeza,
Abrigaram famílias inteiras
E fizeram parte
Das chegadas e partidas
Dos choros e alegrias
Que toda família traz
Me imaginei parte delas
Não no tempo habitado
Por tantos que nelas passaram
Mas me vi através delas
No tempo do agora
Abandonadas e largadas
Ao caprichoso tempo
Que delas a cada dia
Tira um pouquinho
E as derruba sem burburinho
Delas só não trago
Também um tempo de família
Nem de chegadas
Mas apenas de partidas
Também não vivi como elas
A alegria de lindos sonhos
Mas como elas
Sobrevivi aos abandonos
Não completa
Mas tendo partes faltando
Eram tão belas
Imponentes despontavam
Na paisagem se destacavam
Diziam à sociedade
Quais eram suas identidades
Assim, as observando
Uma tristeza foi me tomando
O que antes era destaque
O tempo foi derrubando
Não por serem os dias
Seus algozes
Mas por lhes trazerem
O tempo do abandono
Tempo sem sonhos
Tempo de no vazio existir
Não por serem antigas
Mas por já nelas não haver vida
Só paredes frias
Portas e janelas vazias
Onde só o vento passa
E a poeira levanta
Como cabelos soltos
Sem nenhuma trança
Uns dirão ao vê-las
Que arrepios os fazem sentir
Achando-as assombradas
E fazendo delas
Abandonadas e incompreendidas
Talvez por essa razão
Elas tocam meu coração
No abandono vivemos
Não porque o escolhemos
Mas por qualquer outra razão
Junto a isso, vem a incompreensão
Sangramos no silêncio
Não esperamos atenção
No final, é uma boa analogia
Somos todos casas
Umas habitadas
Pelo amor cuidadas
Outras abandonadas
Largadas e descuidadas
Mas ainda uma casa