JÁ NÃO PERCEBEMOS O RAIO DA LUA
JÁ NÃO PERCEBEMOS O RAIO DA LUA
Caminhei certa vez pela noite,
Junto à tristeza e estive sozinho,
Tinha a chuva e o vento em açoite,
A me torturar, se errei o caminho.
Não deparei com os pirilampos,
Pois as florestas estavam longe,
Somente ruas desertas de campos,
E meu canto lembrava um monge.
Só consegui orar como um cântico,
Pois o pensamento pedia clemência,
Se o mundo não é mais romântico,
E a morte me pediu indulgências.
De nada serviu coletar todo ouro,
Se não há preço na tabela da vida,
E o que falo são faces de um louro,
Que só fala o que decora na lida.
Nas gaiolas de louro e de gente,
Somos todos escravos sem saber,
Tudo enquanto sejamos tementes,
No êxtase demente a sobreviver.
Já não percebemos o raio da lua,
Pois toda cidade é cheia de luz,
Sem sons de araponga e cacatuas,
Temendo soldados e homens nus.
Nudez de alma é reflexo dos dias,
E eles se expõem ao sol e à chuva,
Ao viver de guerras ou fantasias,
Numa vã heresia tão fora da curva.
Quando nos vemos, já é a Ucrânia,
Mas antes foi Síria ou Afeganistão,
E gritam "Selva!", até na Espanha,
Se o povo não sabe qual é a razão.
A Terra é um lar para todos nós,
E existe sem muralhas ou portões,
Somente a gente é um rio sem foz,
Ao sermos açudes sem embarcações.