AS CINZAS E O OURO

AS CINZAS E O OURO

 

Naquele chão sobraram as cinzas,

E já não vejo araras e os angelins,

Nem as onças com as suas pintas,

Como os igarapés desses confins.

 

Tudo é palidez e a vez é do vento,

Triste eu estou sem ver mais futuro,

Tudo são clareiras ou só sedimento,

Que findam comigo no vão escuro.

 

É como a noite, após as fogueiras,

Rescaldo de brasas de tanta morte,

Mesmo quando tenho na algibeira,

As fotografias do que foi o Norte.

 

Garimparam ouro, deixando mercúrio,

E já não há água, meu camarada,

Ela evaporou em meio ao pedregulho,

E os botos morreram na enseada.

 

Nas estradas que passaram tratores,

Com correntes arrastando o que havia,

Chegaram também novos senhores,

Que foram algozes de quem partia.

 

Tudo acabou e os corpos são cinzas,

Ficando a memória de tribos e índios,

Deixando na história só as caatingas,

Mas elas estão bem longe do Índico.

 

Ali foi Nordeste bem antes de agora,

Cresciam florestas além do oceano,

Distrato de África, mas tendo caapora,

Porque pós Saara aqui foi meu canto.

 

Verei só areia de agora em diante,

E mais que calor, terei amplitude,

Vou sofrer junto a quem veio antes,

E a vida se acaba com má atitude.

 

Quem foi Dom e Bruno, buscando paz,

Querendo apenas manter o bioma,

Se quem quer o ouro é mais sagaz,

Como um Caifás servindo a Roma.

 

Serão sempre assim, homens e reinos,

Usando e abusando da mãe natureza,

Com planos nefastos e seus anseios,

Que fazem do meio final incerteza.