Loucuras
Escreverei,
Usarei minha dor
A pegarei pela mão,
A tocarei
Como se manuseasse meu coração,
Um vilãocelo,
Um piano,
Ou só fizesse um pão.
Como se dedilhando as cordas
Do meu vilão.
Mas com o cuidado
De quem a lâmina afia
Para não se machucar
Tendo os dedos cortados
Ao se por a afiar.
Me disseram que sou louca
Louca devo estar
Convivo com meus fantasmas
E também eles irei usar
Para preencherem
Minha existência e ter
De quem falar
Serão eles as plumas
Do travesseiro onde irei deitar
Ou os lençóis finos
Onde sonharei amar
E assim se farão
Como as bandeiras
Do meu extermínio
Quando vieres atirar
Contra mim tuas pedras
Por não me aceitar.
Usarei minhas alucinações:
Um ectoplasma me iluminará
Uma mesa circular
Onde você precisa
Nela se sentar
E em branco papel
Se por a registrar
Uma coisa amável
Só para me agradar
Use as claridades elétricas
Do que irá te iluminar
Te guiando entre as letras
Que tua mão registrará
E minha mente doentia
Ficará a imaginar
Enquanto cozinha
Com o fogo do meu coração
O que irá te alimentar
E te colocarei na mão
O mais perfeito manjar
Temperarei minha alma ferida
Com um vinho tino vermelho
Como o sangue de minhas veias,
Que dos punhos escorrem
Alertando a minha morte
Enquanto a sorte moribunda
Aguarda mergulhada
Em águas profundas.
Use a minha morte:
A gentileza
dos gráficos
Góticos dos seus vermes
Deitando sobre minha sorte
A leitura fúnebre
Descompassada
As pausas eleitas do nada
As frases misturadas
Que acentuam suas palavras
Deixadas como nada
Ofegantes e cerimoniosas
Fingindo ser despretensiosas.
Use sua mortalha,
Seus candelabros,
A língua como navalha
As ladainhas que pode compor
Um canto de horror
A melodia improvável de amor
Use seu inferno total:
Esquente os tocos de minha alma;
Congele as ardências viscerais
Corte minha carne
Com tuas unhas
Jogue-me no frio
Escreva no meu vazio:
Um parágrafo
Uma frase
Qualquer coisa que me cale
Para que nem meus ancestrais
Queiram ouvir-me mais
Diz-me da minha loucura
Faz-me qualquer tortura
Mas não me deixe mais
Abandonada nesse cais
Onde a vida ficou para trás
E a morte para sempre aqui se faz