UM CORPO SANGRANDO

UM CORPO SANGRANDO

 

Às vezes o homem quer desistir,

Quando a lança cutuca a ferida,

E os traumas estão a insistir,

Como pesadelos finais de vida.

 

Ele agora quer o último suspiro,

Numa clausura, sem paz e poesia,

Pois espera o restante dos tiros,

Que o executor faz com alegria.

 

Tudo agora são meros contrastes,

Nos conflitos do bem com o mal,

Que penhoram essa vida de traste,

Que o homem escreveu no jornal.

 

Ele vê o seu corpo sangrando,

Pois já se vê de fora da vida,

Com sua alma somente olhando,

O que restou da vida sofrida.

 

Ele se arrepende por não amar,

Pois roubaram a sua esperança,

Se lhe tiraram coração e o mar,

Restando só a dor de uma lança.

 

O vinagre chega em seus lábios,

Como fizeram com Cristo na cruz,

Ou foi a cobrança de honorários,

Por um corpo sofrido e com pus.

 

Vê os vermes tomando lugar,

Pois o corpo se faz putrefato,

São delírios que buscam somar,

A sua dor como final distrato.

 

Que Deus lhe aceite mesmo assim,

Com seu corpo já tão miserável,

Pois sofreu diante de um jardim,

Sem o direito à flor inefável.

 

Sendo tudo, Deus sabe o que houve,

E talvez lhe aceite em seu colo,

Pois tudo é dele, de zero a nove,

Pelos altos e baixos de um solo.