4 DE MAIO

4 DE MAIO

 

No dia 4 de maio não terei presentes,

Nem mesmo um aplauso ou triste aceno,

Porque me jogaram na vala de ausentes,

Me vendo como um leproso e obsceno.

 

Se eu subir no morro que me revigora,

Lembrarei do passado e da escravidão,

E a pergunta que faço a quem me devora:

- Qual gosto da carne de outro irmão?

 

Não vou ter a resposta que não existe,

E se ainda respiro é por causa de Deus,

Que me diz através do orixá que resiste,

Haver quem torture até Prometeu.

 

Se Davi quis matar só Golias, não sei,

Mas eu sei que a paz é o melhor desejo,

Pois a guerra acende o mal, e eu matei,

Porque ela é desculpa, deboche, bocejo.

 

Serei sempre taurino junto a peixes,

Viverei sendo pragmático e delirante,

Sonhador de um lar numa via de leite,

E talvez seja só um cometa errante.

 

E se for tudo isso, serei incomodo,

Para ser imolado na pira do tempo,

Como um feio lagarto em seu ovo,

A dizer que vivo pra seu desalento.

 

Se ainda chegar noutro 4 de maio,

Vou querer lhes dizer que sobrevivi,

Vou lançar o meu fogo como um raio,

Se eu sou o maior dragão que já vi.

 

Vou cruzar avenidas, subir montanhas,

Vou olhar para Órion e ir mais além,

Vou buscar a razão pra morte tamanha,

Tudo enquanto estou vivo em Belém.

 

Vou falar o que devo para vos salvar,

Vou cutucar as feridas com meu verbo,

Só calando na morte e na falta de ar,

Ou sufocado sob o latido de Cérbero.