MODO IMPERFEITO

MODO IMPERFEITO

 

Tem carro batido na estrada,

Num leito de lama e cascalho,

Sem marcas da última jornada,

Por causa do sol sem orvalho.

 

Ninguém ficou como testemunha,

Nem ao vivo em bar ou restaurante,

Pois foi além de Euclides da Cunha,

Que os ciganos seguiram adiante.

 

Não pensei em vender meu bode,

Por causa de mulas ou cavalos,

Pois só umbuzeiro é que pode,

Suportar o calor onde eu calo.

 

Então, aluguei só um quarto,

Com a janela de cara pra tarde,

No aguardo da hora do parto,

Mas a mulher viajou sem alarde.

 

Me restaram calango e raposas,

E o mocó que comi com feijão,

Sem o quê não tive mais coisas,

Pois esse acidente foi ladrão.

 

Ninguém sabe de onde aparecem,

Mas a estrada fervilha gatunos,

Que deviam salvar quem padece,

Mas os furtos são inoportunos.

 

Morre até gente boa e larápio,

Pois é essa a sina da estrada,

E quem nela se faz de cardápio,

É porque quer a vida frustrada.

 

Hoje já não detemos Canudos,

E foi-se o tempo do império,

Mesmo assim é tudo absurdo,

Se a vida é algo mais sério.

 

Pois agora nós temos direitos,

Até quando adormeça o fascismo,

Mas vivemos de modo imperfeito,

Conflitando ilusão e realismo.