NOITES SEM FIM (a casa e a escuridão)
No tempo
em que a
voz uterina
nos puxava
pelos cabelos,
entrávamos
descabelados,
encabulados,
pela falta dum sorriso
de estrela.
A noite
nos negava
o brilho,
seduzia-nos
só pela escuridão,
para não percebermos
suas nebulosas intenções.
Penetrávamos
na recinto,
apenas de corpo,
a casa nunca habitava
em nós,
a alma ficava
dependurada
na rua da lua,
balançando-se
em devaneios,
a espera do reencontro
com seu invólucro,
como um faraó inerte
em sua pirâmide mortuária.
Quando o alimento
cumpria sua missão,
havia o balbucio
de uma cantiga de ninar.
A voz e a noz,
cada qual nutriam
o sonho e o sonhador.
A noite se esgotava
em suas urgências,
a alma fora levada
para algum outro
hemisférico lugar.
Na primeira manhã,
ansiosos ficávamos,
olhando o globo girar,
como um pião
em rodopios,
riscando a superfície
áspera da espera.
Era uma infinidade de horas,
a casa continuava
incólume,
um bêbado adormecido
sem o exercício da embriaguez.
Ela bem que tentava,
mas nossa porta estava aberta apenas
para a noite ...
e a alma desgarrada.
Foram tantas noites...
Não ouvíamos mais aquela voz,
foi ao encontro
de alguma constelação
cuidar dos anímicos desavisos.
Quem quebraria, agora,
aquela noz!?
Do manto escuro,
restaram os negrores,
nossos temores
e aquele arrependimento
tardio
de nunca ter acolhido a casa,
tampouco recolhido os seus viventes.