COMO ÉBRIO E NÃO ESPARTANO
COMO ÉBRIO E NÃO ESPARTANO
A sociedade vomita a hipocrisia,
Pois come tão mal a tolerância,
Digerindo fantasmas com agonia,
Se afloram traumas da infância.
Hoje é um tempo pós ditadura,
Mas nem todos ouviram os tiros,
E não viram a dor da tortura,
Com a gangrena que não admiro.
Mutilaram não só corpo e mente,
Mas trouxeram a miséria pro lar,
Mesmo não nos dizendo quem mente,
Com as patentes na mesa de bar.
Quem nos guia quer tudo pra ele,
E legisla para somente ele viver,
Pois as covas são rasas sem pele,
De quem morreu sem me conhecer.
Eu vivi numa bolha ou floresta,
Onde a maldade não tinha um dia,
Porque tudo seguia com a festa,
E a bondade da minha anarquia.
Toda regra só serve a quem cria,
Pois as leis são de reis e clero,
Ao querer dizer que é filosofia,
Todo rapto do direito que espero.
Eu já sofro por vários milênios,
Pois sempre fui o escriba do rei,
Que achou me trancar com um gênio,
Quando eu fui Aladim e não Frei.
Foi assim a minha dor no deserto,
Se o oásis só serviu a quem morre,
E por ser condenado ao incerto,
Vou vagar como um ébrio de porre.
Ao sofrer nesse vale de choro,
Pela morbidez dos meus judas,
Verei gotas de sangue no colo,
Mesmo sendo a língua mais muda.
Ou então, verei facas cortando,
As palavras com que faço poemas,
Que dirão que não fui espartano,
Mas fui paz noutro estratagema.
Hoje eu guardo minha alma,
Até mesmo de mim e do tempo,
Pois querem me ver sem calma,
Com meu grito calado ao vento.