ORFANDADE

A tarde lentamente

agonizava em minha janela,

o mundo se debruçava,

arfando-se em expectativas

de improváveis regressos.

A incipiente noite começava

a nascer em seus prenúncios.

Já se podia ver laivos de lua

no útero do firmamento,

seu manto ia trocando

de cores,

numa aquarela pontilhada

de inquietas estrelas.

Pela janela iam

se defenestrando

meus olhares errantes.

A respiração noturna

da atmosfera

orquestrava-se

em meus ouvidos ...

em todos os olvidos,

mal resolvidos.

O silêncio se camuflava

de escuridão.

Estávamos sós:

eu e a tenaz solidão,

cúmplice

de todas as horas.

Erámos amantes

da mesma agonia.

A noite já

nos alcançava,

engolfava-nos

de seus mistérios,

tratuava sua tez

na famélica alma,

como negro farol

a nos guiar

e nos devorar.

Cada noite,

um pedaço

de mim

emergia do corpo,

se afogava no copo.

Ébrio,

entornava,

me tornava

não mais sóbrio,

apenas sombrio,

na penumbra

invisível

das noites sem fim,

órfãs de ti.

Leonardo do Eirado
Enviado por Leonardo do Eirado em 17/09/2022
Código do texto: T7608185
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