AMOR TARDIO

— Não percebes? Eu venho procurar lugar em ti.

Mia Couto (1955 —)

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AMOR TARDIO

Eu venho

das terras longíquas

onde as palavras já se amordaçaram,

e o silêncio,

como se diz,

diz todas as coisas,

defende as causas,

e habita nas casas.

O verbo é mudo,

é servo do vazio,

esconde-se nas frestas

das nuvens

e voa, invisível,

para lugar nenhum.

A noite,

apenas

é o dormitório

das trevas,

o silêncio já muito

negocia com as estrelas,

um brilho sereno

na tez da sua

própria mudez.

A nudez da voz

foi arrancada do quarto

no leito despido,

destituído de ti.

Onde levastes meus sonhos,

deixando-me

entre vigílias inócuas

e pesadelos inquietantes ?

Quero voltar a habitar-te,

em algum recôndito

do teu corpo,

libertar as palavras

para ainda dizer

no desbotado tempo: te amo

Levarei também os silêncios

para depois dos orgasmos,

perceber que tua presença

é o seu refrigério,

e com eles e elas

comunicarem,

em uníssono,

o amor tardio

que guardo

para te dar.

Leonardo do Eirado
Enviado por Leonardo do Eirado em 02/09/2022
Código do texto: T7596431
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