UM SÓ CONTINENTE
Eu guardo em mim
Dois corações
Um que é do mar
Um das paixões...
Fragmento de
"O Bem e o Mal"
Danilo Caymmi e
Carlos Eduardo Carneiro Falcão
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UM SÓ CONTINENTE
O sol espreguiçava-se
no leito
tépido
das montanhas.
Lépido,
o dia ia desenhando
seus contornos
e suas manhas.
As águas plácidas
agasalhavam as embarcações
sob os braços do vento
que penteava seus eólicos fios
com tanto afã,
fio a fio,
um, dois, três, ... nove,
dez a fios
da nova manhã.
O que esperar da batalha dos homens
em campos aquáticos,
nos mares erráticos?
Roteiros
marítimos,
naufrágios,
estreitos ...
presságios,
suplícios ?
Do tempo,
o feixe,
o peixe,
seu intento.
Será que ele vem?
O alimento, a face
tão aparente;
pescador-sonhador
quer fisgar
seus amanhãs
e o seu amor,
urgentemente,
antes das cãs.
No fundo do mar,
oceano
a lhe esperar
há anos
o lar que
ele deixa,
e o deixa
seguir,
aflito,
seu destino
sua paixão
de menino,
esperando
o apito
do entardecer
para retornar,
dos braços de Iemanjá,
para o colo do seu amar.
No dia seguinte,
há de tudo recomeçar
uma nova partida,
traição consentida,
uma oração contida
uma súplica contada
para a rainha das águas
não guardar as mágoas
e devolver seu homem
do mar que o consome,
com muitos deles some.
Terra e mar,
saída e chegada,
angústia e alívio,
todos um só
continente,
o mesmo presente
que custa a acabar
assim como o dia,
ou sua eterna agonia
de não conseguir voltar.