Esfomeado
I
- Cobre-te de nuvens ó minha alma
Grita pra rasgar suas cadeias
Logo, porém, cala-te,
Dá me um tempo pra poder me recompor.
Não sei se raios ou se fogo
Se enchente ou terremoto
Mas minha cabeça feito fogo
Amanheceu a arder.
E tudo a suceder soou acusação,
Humilhação, prostração de uma alma pequena,
Não por humildade.
Vitimismo e mesquinhez.
Há quem ame por primeiro e disposto esteja a morrer,
A Deixar-se a cada instante,
E Nas mãos da vida esteja a correr,
Não ansioso, perturbado, controlador, distraído, irracional ou amargurado,
Mas sereno, dedicado, sensível e aí, sim, presente de fato.
II
- Cobre-te de nuvens ó alma?
Grita pra rasgar suas cadeias!
-Porém, logo cala-se, não se deixa toda inteira.
Pensa sua mente imaginosa
quando vê nisso a mão de Deus
Um choro triste e profundo lhe vem,
Olhar cruz e no trabalho a toca
Se decide ali estar.
Na missa reza e vê no altar o amor ardente,
Duma pessoa que outrora padecia
E a percebe agora viva dentro e fora de si
E quão grande fora aquela agonia..
- vivia e amava como se morrer fosse ia.
no trabalho o traz consigo
E dele distraído se pega a reagir
A medos, pecados, fatos que já aconteceram ou irão acontecer,
III
- Cobre-te de nuvens ó alma?
Gritas mesmo pra rasgar essas cadeias?
logo cala-te com instantâneo recompor.
Atado a uma presunção de certeza,
A uma vergonha imensa,
A uma antiga saudade.
Dum estado febril.
Nada há de concreto
A não ser a dor de cabeça,
Uma vontade morna,
Uma inteligência embaralhada,
E uma face cabisbaixa.
E um sono que não lhe restaura.
Se imagina morrendo
Se entrega inteira naquilo que faz
Neste curtíssimo ensaio.
De novo reage indefesa
A um passado ou futuro, que no presente lhe tenta com um religioso dardo.
A mente pesa.
E o relógio interior lhe apressa,
Pois se algo de Deus vê
Como então continuar a se esconder?
Sua maior dor é estar à postos
Cumprir no trabalho o dever,
E aceitar estar com Deus ,
sem pensar nele o tempo todo.
E mandar tanto medo pro inferno,
Engolir o ego, deixar que o que nega se mostre no ventilador
E pedir comida pra valer.
Aceitar comida, sem vergonha de encher o prato,
está há muito com fome,