DEPOIS QUE VOCÊ SE FOI

Engravidei-me

de saudades,

anoiteci em definitivas ausências.

E foram tantas,

que meus outros vazios

pareciam apenas caprichos infantis.

Até o inconformismo

me foi efêmero,

não coube mais

numa partida cruel

Na escultura da despedida,

o sofrimento

ficou com o cinzel.

De que se alimentaria agora minha solidão ?

Livros, cartas,

lágrimas, lástimas ?

Suas roupas tão negras

me olham

no fundo do armário,

procuram seu corpo,

seu cheiro não mais as colore.

Havia uma imagem sua alí,

atrás da porta da frente,

à frente do porta-retrato

atrasado,

na moldura do quadro,

um filme não revelado,

a página arrancada,

pátina oxidada

que tempo me tirou

quando lhe levou.

O terço

em cima da

cômoda,

incômoda,

do quarto

virou um rosário,

um calvário

de contas sem fim,

depois do seu fim,

não há mais nada

para contar.

A mesa continua posta,

mas a fome é póstuma.

O relógio na parede

já não faz

mais sentido,

não há porque

acompanhar

o giro dos ponteiros.

Não há mais voltas ...

não há mais volta.

Volta!

Ou me leva contigo.

A morte da vida,

a vida após a morte,

ocupam o mesmo lugar

nessa sepultura

que a minha dor

não consegue fechar.

Leonardo do Eirado
Enviado por Leonardo do Eirado em 15/02/2022
Reeditado em 15/02/2022
Código do texto: T7452438
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