OFERENDA
Ouço-te na primeira hora
com teus cabelos dourados,
a despentear os furacões,
embaraçando-os em brisas
com as escovas e alcovas secretas do teu desalinhar.
Vezes outras são os teus lábios
que amordaçam a boca do tempo
para que toda mudez se curve
diante do teu beijo
e a palavra enclausurada
testemunhe
a inutilidade de qualquer dizer,
quando o silêncio da tua língua
traduzir a linguagem implícita
do desejo.
Eu te sinto em descompassado
frenesi,
vulcão a espalhar-se em larvas
no leito tórrido do teu corpo.
Nas janelas
que se entreabrem para mim,
— assim penso eu —,
percebo-te inacessivelmente excitante,
nas frestas dos amores proibidos
que tua alma fermenta
no meu bojo, no teu seio,
na veia que pulsa
e me impulsiona para ti.
E quando te concebes na imagem
mais sacra do teu inverossímil pudor,
são os meus versos,
iconoclastas,
que te violam,
desenhando-te
em rimas
e ritos de prazer,
aguardando com inquieta sabedoria
se consumarem
para
se consumirem
no mais lírico dos pecados
que meu amor pode te oferecer.