DEPOIS DE CADA ATOL

DEPOIS DE CADA ATOL

O casco da minha nave sacode!
Serão as marés ou aquele torpedo,
Melando a proa de meu bigode,
Molhando a barba sobre o penedo?

Assim são os dias como jubarte,
Se meu cachalote quer lodo de mar,
Quando o suspiro faz-me de arte,
E meu capote é lua e o sonhar.

Todas as vezes que balas me atingem,
Meu peritônio me lembra a gordura,
Mesmo quando sucumbo à vertigem,
E caio no limbo da minha loucura.

Depois de singrar profundezas,
Além de vagar após Gibraltar,
Me prostro às raras belezas,
Que cada atol retem a guardar.

Eu vejo as enguias e esgotos,
Encontro siris e conchas que há,
Que adornam sereias e botos,
E unem os rios pra só enxaguar.

E o sal vem com seu prognóstico,
De trazer vida além beira-mar,
Na escala da lida em que aposto,
Ser mais que omnívoro a andar.

Pois ser como gente ou urso,
Mas ter o recurso de tudo mudar,
Me faz provar mel por recurso,
Revendo abelhas a me lambuzar.

E assim, com arpão e meus dentes,
Devoro os duendes que guardam o luar,
Com todas poções e sementes,
Curando os doentes sem desanimar.

Contudo, ainda me vejo peludo,
Sendo um humano e não avatar,
Tendo ao quadro um raro canudo,
Que a Deus não vai bastar.