COMO UMA BAILARINA

O que de mim eu sou,

no espetáculo de horror

que a vida se transformou?

Receptáculo de toda dor,

sou plateia, mero expectador,

ou na odisseia

eu serei um cabotino,

em meio ao desatino,

fazendo graça

da desgraça,

com trapaça,

sendo um réles ator,

torpe e enganador?

Tento ser santo,

como que por encanto,

mas pela via do pranto

para meu ingênuo espanto

não sou nem mesmo o andor.

Ou serei aquele

que de mim regresso,

buscando progresso

nas veias, nas vaias

nas valas, nas velas

de onde fui egresso,

da peça que fui sucesso,

mas que do tempo

não restou nem o ingresso?

Não sei por que ainda há chama

na voz que chama e não inflama

do peito vazio que já não clama.

Da bandeira que um dia hasteei

contente

só sobrou a flâmula débil e

impotente.

Mas se ainda me resta

algum amor próprio

suficiente nessa festa

infame e baldia

digna de opróbrio

de uma bacante fria,

que mais parece a farsa

que tanta vilania disfarça,

não serei o imundo

a pisar no teatro

moribundo

que no palco do drama

em toda sórdida trama

fez de mim vagabundo.

Mas se for esta minha sina

neste mundo tão inverso

vou andando assim à esmo,

levando comigo toda rima.

Carrego, enfim, meu verso

e como a teimosa bailarina

vou dançar pra mim mesmo

no centro de outro universo.

Leonardo do Eirado
Enviado por Leonardo do Eirado em 03/04/2021
Código do texto: T7222887
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