O MENINO NA PORTEIRA
O menino ao longe
observava com olhinhos de encantamento
aqueles homens tangendo o gado.
Pés e patas iam se movimentando
num ritmo sincronizado,
sinfonia disciplinada
de mugidos
sob a batuta de um berrante.
Sonhava algum dia
atravessar a porteira e,
montado num cavalo,
conduzir essa orquestra
pelo pasto que parecia
não ter fim.
Também ouvia o som
acólito,
canino
organizando aquela procissão.
O menino sonhava
e a boiada passava
até que ele não a enxergasse mais,
a não ser com as retinas da imaginação.
Esperava, ansioso, o retorno dos maestros
para ouvir estórias de suas cavalgadas
e aumentar seu estoque de sonhar.
Mas ainda tardaria um pouco
para o sonho infantil vestir-se
de adulta realidade.
A vida, por certo, lhe reservaria
outras viagens,
haveria de tanger outros sonhos
em caminhos
que também se perderiam no seu
ingênuo olhar.
Novos brados e berros
estaria por ouvir ou dar,
portas, outras, atravessaria
para depois entender
que o mundo é sem porteiras.
Mas a despeito de qualquer
vicissitude,
na inocência daquele pequeno-sonhador,
procurava todos os dias
em todas as estórias
ouvidas,
nunca se esquecer
que antes de qualquer coisa
era imperioso tanger a esperança
e nunca a perder de vista
nos pastos da sua alma.