CORAÇÃO ESTURRICADO

"Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.

Tempo de absoluta depuração.

Tempo em que não se diz mais: meu amor.

Porque o amor resultou inútil.

E os olhos não choram.

E as mãos tecem apenas o rude trabalho.

E o coração está seco."

Fragmento de "Os Ombros Suportam o Mundo."

Carlos Drummond de Andrade.

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CORAÇÃO ESTURRICADO

E bebia, se embriagava

da amargura do cálice.

Se entregava a cada gota

como náufrago,

afogando-se

em doses infaustas.

E se embebia do líquido

cru, desbotado,

que caia inócuo na garganta árida.

E mesmo que engolisse o oceano,

ainda assim, não saciaria sua sede.

Já não adiantava o curso

etílico do rio ou de qualquer outra líquida corrente para as entranhas.

Dentro de si, o leito secou-se à sombra

do que não mais hidratava a sua alma.

Apenas ficou a cicatriz

na poeira invisível,

daquilo que um dia foi

destinado a ser mar,

mas que a secura do seu coração tornou

obstinado desamor.

Leonardo do Eirado
Enviado por Leonardo do Eirado em 14/01/2021
Código do texto: T7159836
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