PRIMAVERA SOLITÁRIA
Outra vez veio a primavera.
Carregado de odores e de cores,
outobro encontra-me adormecido.
Hiberno entre os vasos das primeiras flores,
alegrando ramos pálidos e saudosos
daquelas desfolhadas no tempo...
Na manhã morna, afogo-me no ar tépido.
Entre mim e os vivos e os mortos
só mesmo as matinês e os vesperais
dissolvidos no silêncio das ruelas antigas
de cemitérios abandonados.
Não ligo às florações nascendo
por entre pedras desgastadas dos canteiros,
enxergadas pelas frestas das pétalas
sem cor.
Nem sinto gozo com os olhos
perto das bordas do chão em plena tarde.
E à noite, se elevo a vista, apenas,
contemplo nas dobras do céu estrelas
morimbundas a me convidarem
para uma dança no baile do medo.
Velho e só, carrega-me o outono –
a primavera já não cabe em mim...