Estreito
Maneco diz:
Vâmo nego pra rua batê panela.
— Um coração negreiro desagua sobre a face De sua veia nordestina.
Josafá só tinha uma panela vazia sobre a pia.
O outro planta sobre a norma
Da língua sua lábia
Vomita sobre o ouvido da cidade
A parábola do jornaleiro.
O governo devora o oceano,
Engole melhores garoupas,
Oferta a linha do horizonte aos pobres
No retinir das panelas nobres
Sobre acalanto da mentira.
Vambora nego pra rua se lambuzar no Manifesto.
Josafá desolha cabisbaixo.
Definha sobre maldição política,
Tropeça no inacreditável,
Cai dentro dum abismo existencial.
O nego tem coração pintado de canavial,
N'alma um sol raquítico colhido no inverno,
Cabeça sertaneja atolada em
Problemas máximos.
A política é uma fábula notória
Pra se distrair depois do necessário—,
Sussurra o ferrugem do tempo.
Enquanto o tempo sussura,
Surra hipnótica política acontece
No tecido paupérrimo.
O cheiro nos restaurantes invadem
O estômago,
A falta de emprego,
A desaprovação no mercado social,
A incompetência de ser gente,
A prestação do aluguel vencida.
E há ferida por escândalo político
A deixar dissabores de fera no intento.
A televisão escancara os três poderes
Corrompidos.
Maneco insiste:
Amanhã terá greve geral Josafá.
Vâmo desfilar sobre a Paulista
Vâmo fazer história por um bem maior,
Vâmo mostrar pro mundo
Nosso modo pacífico de fazer justiça.
No coração do nego os cactos apertam Exangue.
Josafá pesca na ideia
Os conselhos justos do pai.
Qual crise é maior que a própria
Dor do homem escravizado
Por outro homem.
Qual crise supera os estigmas
Do homem retido num aquário
De ilusões.
O medo da vida arranha o ego.
Maneco repara:
Eis um sujeito sujo de verdades.
Depois dele o mundo continuará
Nos filhos,
Porém a vida permanecerá sendo
Um navio negreiro pegando fogo em
Alto mar, sem bote salva vidas.
A indústria permutará incólume
Assaltando o tempo,
Assalariando destinos.
aBel gOnçalves