A Terra da Tua Infância
                                            
      Ali naquele café, sentado naquela mesa,
      Onde dizem que era tua.
      Olha só o que aconteceu.
      O dono do café enriqueceu.
 
       Fizeram uma estátua tua, jogaram-te na rua.
       Nada de ficar isolado, quem quiser que sente
       ao lado.
       Vale abraçar, tocar, vale até fotografar.
 
       Quem disse que gostavas de abraços, de braços
       a te tocar?
       Não respeitam a solidão que vivias então.
       E vão ali porque vão. Porque é chic entrar no teu porão.
 
       Sem dó nem piedade invadem aquela hora como
       se fosse agora.
       Enquanto ali vivias, lias, escrevias, ninguém queria
       saber o que dizias.
 
       E continuam a não querer saber nada do que lhe
       querias dizer.
       Vão ali por vaidade como quem vai desfilar o fato
        novo que acabaram  de estrear.
 
        Nem a alma que levam se levanta quando toca
        a manta que te agasalhava quando o frio chegava.
        Como quem está de férias,  vão entrando.
        Nada lhe diz nada.
                        
        E vão devassando o teu esconderijo.
        Ali os sapatos que calçavas. As roupas que usavas.
        Aqui a mesa onde escrevias.
        Ali a cadeira onde te sentavas enquanto pensavas.
 
        Pensar, quem quer pensar!
        Quem dita a vida agora é o lá fora.
        A tendência é viver de aparência.
                         Outra hora.
 
         Cantar conforme a música.
         Perder o tino, desfiar o novo hino
                     Que se chama
                     Sem destino.
 
                                                                Lita Moniz