O BÊBADO

Emerge um bêbado de porta adentro

E eu, sóbrio, o vejo sujo e maltrapilho

A se arrastar no meu apartamento...

"Diga o que foi! O que tu queres, filho?!"

Eu não contei, mas este ébrio estranho

Provém do ventre de minha ex-mulher,

E, apesar de todo o seu tamanho,

Eu nunca dei a ele um pão sequer!

Sim, é meu filho... é o filho do passado

Que eu enterrei no esquecimento, e agora

Que no aposento estou acomodado

Bate-me à porta, bêbado, essa hora...

E, estando velho, sinto neste instante

Que foi na vida o que eu senti pior!

E o olhar pergunta ao bêbado purgante

"Por que, meu filho, que eu deixei-te só?"

Ele, porém, não me responde, sinto

Somente as mãos a me pedir ajuda,

Passo a negar-lhe o meu olhar sucinto,

E a dor mantém a minha boca muda.

Meu pobre filho... O pus em minha cama,

Ele me olhou feliz, embriagado,

A roupa suja, o pé coberto em lama,

Forçou sorrir e disse-me "obrigado!".

"O que faltou-te, filho? Eu te darei!

Diga ao teu pai como te socorrer!"

Porém, fechando as pálpebras, notei...

No meu colchão meu filho vi morrer!

Foi para isso que Deus te mandou?

Para pagar à mãe teu santo berço...?

Ela viu os teus passos, te criou,

Viu-te nascer e eu vejo o teu inverso!

Vejo o teu fim, e, em parte, o meu escrevo!

Todas as pedras de dor quebram meu muros....

É que esta vida me cobrou com juros

Centavo por centavo que te devo!

Jackson Viana
Enviado por Jackson Viana em 16/03/2017
Código do texto: T5942429
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