Uma Flor no Cemitério
Vi uma flor no cemitério,
Quente, branda e inocente,
Sem malditos nem mistério
Cresce veementemente.
No térreo do edifício de corpos,
Desafia a donzela o pendor da natureza,
Crescendo das cinzas, do vácuo...
Floresce a rosa na necrópole.
Homenageando teus vizinhos pagãos,
Banhada em sangue, vermelhecente.
O triunfo retumbante,
Das catacumbas moribundas,
O perdão do homem traído,
Da terra ressoa o grito da moça.
Sua garganta, intacta.
Nesta casa, onde a mãe de todos,
Não atura filhos ávidos,
Cantando baixo em voz acintosa,
Para que estes assim durmam,
Frios, secos, mórbidos.
Desta terra pobre,
Que forças faz brotar
Tal linda forma de vida?
De onde vêm tais sentimentos,
Que constituem os zelosos espinhos
Da esplêndida Dama Espanhola?
Direis então,
Sem a certeza de expor a própria graça
Deste solo estéril,
De alma vaga e clandestina,
A história de seus defuntos
Alimentam o coração da rosa,
Esta, a nobre mensageira,
De que os corações ali não pulsam,
Contudo os olhos ainda choram,
E vêem a luz que ao meio dia
Passa breve,
Por entre as rachaduras dos velhos jazigos.
Vi a flor do cemitério
Quente, branda e inocente,
Nos malditos eis seu mistério
Cresce fervorosamente.
Ali há vida! Há morte! Há esperança.
Esperança! Eis a palavra.
O amor que inda hoje transpira,
Alimenta a flor.
Os risos há tempos ocorridos.
O calor de quem tenta voltar.
Em faces,em pétalas,
Está o tapa.
Em sua carne a prova viva,
De que no cemitério do cheiro mais sórdido.
Da névoa mais densa e fria,
Ainda ecoa a flor,
A guerreira transcendente dos séculos.