Gritaram-me bicha
Tinha treze anos apenas,
apenas treze anos,
Que treze anos!
Não chegava nem a onze!
De repente umas vozes na rua
Me gritaram Bicha!
Bicha! Bicha! Bicha! Bicha!
Bicha! Bicha!
- “Por acaso sou bicha?” – me disse.
SIM!
- “E o que é ser bicha”
Bicha!
E eu não sabia a triste verdade que aquilo escondia.
Bicha!
E me senti bicha
Bicha!
Como eles diziam
Bicha!
E retrocedi
Bicha!
Como eles queriam
Bicha!
E odiei meu jeito de andar e meu jeito de falar
e olhei apenado meus amigos que agora queriam se afastar
E retrocedi
Bicha!
E retrocedi
Bicha! Bicha! Bicha! Bicha!
Biiiiichaaaaa!
E passava o tempo,
e sempre amargurado
continuava levando nas minhas costas
minha pesada carha
E como pesava...!
Me escondi no armário
Fingi ter uma namorada
Mas entre minhas entranhas sempre
ressoava a mesma palavra
Bicha! Bicha! Bicha!
Bicha! Biha! Biiiichaaaa!
Até que um dia retrocedi tanto
Que ia cair
Bicha! Bicha! Bicha! Bicha!
E daí?
Bicha!
E daí?
Bicha!
Sim!
Bicha!
- Sou!
Bicha!
- Bicha!
Bicha!
- Bicha sou!
Bicha!
- Sim, bicha!
De hoje em diante não quero mais
me esconder
E vou rir daqueles que usam “viado” como se fosse uma ofensa.
E que cor temos?
Vermelho! Laranja! Amarelo! Verde! Azul! Violeta!
E como é linda a diversidade!
Enfim compreendi.
ENFIM!
Já não retrocedo.
ENFIM!
E avanço segura.
ENFIM!
E bendigo aos céus porque quis Deus que eu nascesse assim...
E já compreendi.
ENFIM!
Já tenho a chave...
Tenho orgulho do que eu sou.
- GAY EU SOU!
Este poema é uma adaptação do "Gritaram-me negra" da compositora, coreógrafa e desenhista, expoente da arte afroperuanada Victoria Eugenia Santa Cruz Gamarra.
Acesse o original aqui: http://www.emdialogo.uff.br/content/gritaram-me-negra